25 de setembro de 2009

Um pastor, um pai, um canalha (parte 3)

A igreja local estava em festa. Eram comemorados os 20 anos de ministério do pastor Tobias, ininterruptos. Hinos, saudações, homenagens emocionadas, fervor nas orações de agradecimento a Deus pela vida daquele santo homem, línguas estranhas, poder. Eu era o único que não estava dançando e caindo ao chão, como um louco? A igreja não era mais minha base, minha referência. Minha "estante", feita de caixas de papelão abarrotadas, embaixo da minha cama, já não incluía a bíblia como livro essencial, bem - vindo. Que bagunça! Que barulho! Como aquilo podia ser a verdade, a razão de viver de tanta gente? O culpado? estava ali, com seu ar impoluto, terno novo, comprado com o dinheiro do dízimo, que ele sempre pegava, e não devolvia nunca. sabia que não havia ninguém que reinvindicasse aquele valor. No centro do púlpito, rodeado por outros tratantes, sentia-se dono daquelas almas, senhor de suas mentes, único mentor . Sempre olhava para mim; e recebia ojeriza em troca, desprezo, nojo. Onde estava a devota Marly? Na mesma localização geográfica do primeiro banco, ao centro. O pastor Tobias não a queria longe do seu campo de visão; não confiava naquela mulher potencialmente adúltera - todas eram, assim estava escrito na palavra de Deus - dizia. Vez ou outra Marly ganhava marcas novas, devido a estas "potencialidades" que ela nem sabia possuir. Muitos convidados e animação, tudo para a glória de Deus. Eu sabia que o grande homenageado não estava nem aí para aquela bajulação tola. Sua vítima mais recente, uma filha de um presbítero íntegro, gorducho e "baba ovo", estava lá também. Novinha, no leite. Fascínora miserável! Que vontade de gritar aqelas palavras, acabar com aquele teatro ridículo, e revelar a mais pura realidade; os anos de solidão e tormento da devota Marly (era sempre assim que chamava minha mãe), dos meus sonhos ruins, das minhas dúvidas, do terrorismo sagrado que era imposto a participar, e da farsa, da pestilenta e degradante farsa daquele homem, miserável e vil, que infelizmente tinha que carregar em meu corpo como prolongamento de sua hereditariedade, e que odiava mais do que tudo; meu pai, Tobias, o pastor. Não aguentei ficar ali, fui para fora do templo; a noite parecia tão solta, e a cada vez que sentia aquele embrulho no estômago, causado pela imagem daquele verme em pose de messias, pelo ar quente e fedido das bocas dos crentes, a gritar hinos e choros a um deus que nunca agradeceu ao espetáculo em sua honra, minha mente trabalhava, queria um fim. Admirava os romanos. Eles não perdiam tempo em degolar aquelas gralhas, que espalhavam um deus bárbaro e incompreensível; os leões, famintos tinham um pouco de indigestão ao final, mas não se ouvia mais tantos colóquios incoerentes depois de uma sessão nas arenas. Bela Roma!
Mais um final de culto, mais uma vez do lado de fora, cumprimentando as pessoas, os irmãos, mais uma vez olhando as novas aquisições da igreja em matéria de mulher. A devota Marly, reunida com as irmãs da sociedade feminina, nem disconfiava, ou se assim procedia nada podia fazer. Aquela noite seria diferente, eu havia jurado.

Continua...

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