28 de junho de 2010

Uma Revolta Humana e a Alma de Um Cachorro

Às vezes não consigo entender minha própria estrutura. Sentado neste banco de praça, uma praça qualquer, de uma cidade qualquer, num mundo qualquer, este ,só meu. O exercício diário de atingir a felicidade, o prazer, contaminou grande parte da Humanidade; em meu sangue corre mesmo esta imunidade a esta infecção que me parece torpe, esdrúxula, sem sentido. Como posso ser feliz se nem ao menos consigo aliviar a dor deste cachorro que me pede o resto de pão que comi apenas por conveniência? Eu sei que estou num círculo vicioso, encarando os fatos com aquele pessimismo peculiar aos ditos desagráveis, bobos. Justamente este pessimismo tem me feito um grande bem, me feito enxergar que é inútil a luta, é cansativo o ciclo, é vã a peleja.
Tento escrever, não consigo, tudo já foi dito; tentei várias vezes ceder o melhor de mim, com intensidade, criatividade, doses cavalares de vislumbre e alegria a ela, que aos meus olhos era tão bonita, tão esperta, mas que se mostrou, com o tempo necessário para um piscar de olhos, ser tão comum, tão babaca. Que bobeira! A culpa não foi dela. Egoísmo é a palavra-chave, e comportamentos como os meus, sinceros, aliados à lembrança que teima em não olvidar, este combustível maldito que move a grande besteira do persistir, que não se mete em algum canto no cérebro onde as coisas malquistas devem ser postas, são desprezíveis, na maioria dos casos. Queria mesmo ser cruel. É assim que veem as coisas. Ninguém se importa com o que você pensa, mesmo se for uma abordagem inteligente e sagaz; preferem mesmo o razoável, o piedoso, o límpido aroma da palavra que se quer ouvir. Gosto de ouvir coisas legais, mas perceber o cheiro azedo da gentileza, forçada, hipócrita e escrota, é foda. Disfarça-se tudo nos movimentos do agir, mas não as pupilas em olhos mentirosos. Fui taxado de introspectivo, calado, mesmo estranho, várias vezes; por que tanto incômodo na capacidade de vasculhar o interior de um corpo em dúvida, não conformado com o que se vê, com o que se ouve? Eu não estou alheio às idiotices, às fanfarrices dos outros apenas porque não abro a boca; abri-la para quê? Não ser entendido e receber todo o tipo de digressão visual, como se estivesse sujo de merda? Tempos difíceis, como sempre.
Há cachorros mais interessantes do que primatinhas que acham ser os donos da razão e do sentimento dos outros. Estes bichos não temem sentir, percebeu? Não divagam sobre possíveis pedradas, chutes, água quente ou mesmo a morte por serem impertinentes, eles simplesmente se aproximam, esperam, e sentem. Para eles todos são criaturas amáveis em potencial, e, portanto, passíveis dos mais verdadeiros momentos de alegria. Abanam o rabo, quando têm algum, demonstrando que estão abertos, suaves, prontos para seu sim ou seu não; pouco importa. Não param de tentar. Nisto eles são bem otários. Quando não se quer, é hora de desistir e sair o quanto antes, e mesmo assim ainda há maldade, ainda há chutes, pedradas, água quente e morte, apenas por maldade. Com este aqui não vou deixá-lo esperando; uma partícula da Natureza quer flertar comigo, ser meu amigo, me ouvir... vamos, eu levo você para casa...

25 de junho de 2010

Um conto para crianças infelizes

Se aquilo poderia ser chamado de lar, eu tinha um. Rua lamacenta, num bairro ainda mais sujo, num agreste destes. Não sei a metragem do nosso espaço privado; era pequeno, fato. Grande mesmo era a miséria, a fome, as caras tristes e mesmo despreocupadas dos adultos. Éramos, as crianças, em oito. A primogenitura coube a mim, e acho mesmo que ser o primeiro é bem triste, porque sempre as impressões, as responsabilidades psicológicas com os demais, as surras, as privações, tudo também acompanha este "privilégio" patriarcal. Acho mesmo que a fome e o frio eram iguais entre todos, não havia divisão ou posição social dentro da casa que escapasse a um telhado cheio de furos, numa chuva de inverno violenta. Se necessito traçar um perfil familiar, começemos.
Meu pai (para não fugir daquela hierarquia dos nomes, sempre o homem em primeiro plano, do paternalismo que já citei) era magro, barbudo, vagabundo e viciado. Veja, tudo está intrínseco, tudo se encaixa. Magro, da fome que passou e ainda passava; barbudo, porque não tinha interesse em aparentar-se com aquilo que não era, ou seja, gente; viciado, pois para isso sempre havia meios de subsistir, de sempre ter mais cachaça, droga, e com isso mais tempo disponível em outro plano que não fosse o da realidade; e vagabundo, porque, segundo ele mesmo dizia, não havia estudado, e o mundo andava difícil para quem só sabia ler e escrever. Neste ponto ele estava melhor do que eu. Nem isso me foi dada a oportunidade, na época, de usufruir. Ele era tudo isso que relatei, e muito mais. Era triste. Este sentimento é tão comum em ambientes como este, que ser alegre nem se cogita, nem se sabe bem o que significa tal palavra; aquele que rir, seja por qual motivo for,leva tapa; é falta de respeito com a situação, com o castigo que foi imposto pelo moço do quadro. Sim, o moço do quadro. Cabelos escovados, a pele bem branca, olhos de um azul impossível de reproduzir, um olhar ainda mais enigmático; parecia que ele tinha pena, e não raiva, da gente. Meu pai tinha o maior orgulho de ter aquele moço consigo.
Minha mãe era bem moça, mas não era isso que dizia seu corpo. Peitos horríveis, mordiscados pelo meu irmão mais novo, feridos e dormentes. Eles estavam sempre à mostra, tentando ainda reagir, exercer sua função sacerdotal de dar o que comer a quem pede, sem muito modo, já que os homens, nas portas aonde ela se abaixava para pedir auxílio, não estavam muito dispostos a fazer esta tarefa a um estranho. Ela também citava o moço do quadro, dizendo que a moldura estava gasta; tinha sido de sua avó, que passou para a sua mãe, no sítio, e agora estava com ela. A provisão era sua responsabiidade, tinha que trazer alguma coisa para casa, para alimentar a prole, enquanto o macho dominante estava em alguma esquina dessas, tomando uma caninha. Ela era ainda mais triste do que meu pai, mas tinha um olhar parecido com o do moço do quadro. Esse moço já deve ter visto muita coisa.
Eu estava ali, e nem sabia muito bem o por quê. Sabe quando você se pega sem um sentido real, nada que possa sustentar a ideia de que você deveria estar onde está? Pronto, era isso. Tinha um cantinho só meu na casa. Havia três cômodos. Uma sala, onde todo mundo dormia, no chão, sem móveis. Um beco, com uma saída que, segundo minha mãe, era a cozinha, com uma mesa de madeira bem velha,desativada por falta de uso prático, e um banheiro, onde só um por vez poderia ficar, e não por muito tempo, com o risco de desfalecer. Mesmo sem comida em casa, o banheiro era bem utilizado. Meu canto era embaixo desta mesa. Meu rato, um gabiruzinho novo, morreu ali, e achei aquilo tão íntimo, que acabei adotando o lugar como meu. Ele procurou um canto onde nem eu nem ninguém pudesse ver sua morte, e talvez o que eu pretendia fazer era justamente o mesmo. Mas morrer é fracassar. Numa situação daquelas, tudo deveria persistir, com a dignidade que desse. Meus outros irmãos eu não vou citar nomes nem posturas. Um infeliz só basta.
Naquele dia tudo corria normalmente, ou seja, cada segundo era uma dor, uma pulga arrancada da roupa, uma tentativa escondida de riso e imaginação com um tijolinho quebrado, que de repente se transformava em um carrinho à fricção visto na TV, na rua, quando todos os vizinhos já tinham sido amolados em busca de alimento. O moço do quadro estava ali, nunca se mexia, nunca piscava, nunca ria; melhor moço não poderia ter seu retrato ali. Era passivo, conformado, inerte, mesmo com toda a súplica de minha mãe, dia e noite, pedindo a ele que o dia não mais surgisse, pelo menos para o caçula, que tinha destruído seus seios e continuava faminto, choroso e barulhento. Nunca pedia nada para ela, minha mãe. Pai estava na frente de casa, numa cadeira velha de balanço, cigarro na boca e meio inebriado. Os meus irmãos estavam na sala, se coçando, (as sarnas não deixavam a gente em paz) quando cheguei com mãe da feira. Naquele dia a cozinha ia ser reaberta ao público, depois de muito tempo. Tomates, que disseram que estavam podres, eram uma iguaria apreciada pelos manos e por mim. Um monte de vagem, onde sobravam ali vez por outra alguns feijões verdes, estava num grande saco, e eu tinha a tarefa de procurar estes remanescentes; uns 10 kg de vagem não davam mais do que 50 feijões. Tudo foi embora em questão de segundos, mas o caçula vomitou o que comeu. Era duro demais pra ele, não estava querendo entrar no rol dos que "comem até pedra".A feira estava cheia naquele dia, muita gente se adiantando nas compras, porque era tempo de copa do mundo. Nem sabia o que era isso no momento . Disseram que era futebol.Tá certo que vi alguns meninos jogando aquela bola de um lado pro outro numa rua em que fui pedir, mas não achava graça naquilo; tinha fome. Não sabia que o mundo perdia seu tempo com aquela bobagem também.
Vou voltar para aquele dia. Meu irmão chorava mais do que o costume. De onde vinha tanta força para gritar, para reclamar da falta, da inanição que tinha? Sobreviver é achar forças onde elas não existem. O único que tinha alguma paz naquela tarde era o moço do quadro. O resto, todo, estava ou ficando surdo com os gritos, ou perdendo a consciência pela escassez do estômago. Mãe não conseguiu mais suportar aquilo e deu o menino para que eu segurasse, e me disse que ia nas redondezas achar alguma alma caridosa que a acudisse com um pouco de leite, mesmo que fosse estragado. Olhou para o moço do quadro, mas sem aquele olhar clemente de antes, e se foi. Os outros seis eu havia juntado na sala, e sentei no chão da cozinha, junto com o pequeno, que tratei logo de soltar, numa margem segura para ele. Sentou-se e continuou a chorar, efusivamente. A porta principal da casa, que era, como todas ali por perto, de madeira e dividida ao meio, foi arrombada, violentamente. A distância desta para onde eu estava era mínima, mas pai passou algum tempo procurando o epicentro de seu tormento, de sua impaciência, esta mesma que ele produziu num instante de pernas abertas à força e de animalidade. Ele, ele mesmo, era o meu tormento.
A gritaria na sala era evidente. Tudo foi revirado e ele não conseguiu achar o caçula. Estava drogado demais. Trouxe para casa uma nova forma de suicídio coletivo. Finalmente seguiu um instante de sanidade e percebeu que o choro vinha debaixo da mesa; a destruiu com um golpe (ela estava podre), e o apanhou pelos pés. Eu fiquei no meu canto, mas não sem minha recompensa por tê-lo feito de imbecil. Um chute na cara dói, e os pés dos pais são ainda mais contundentes. Vi meus irmãos, que estavam na sala, saírem apressados. Também vi aquele homem destruído pelas fugas que escolheu na vida segurar um pedaço grosso da mesa que acabara de destroçar e seguir para o colchão, onde estava o caçula, que continuava chorando como um louco. Não vi o espancamento; não vi o olhar de pai, suas feições, seus pensamentos quando estava fazendo com que o seu filho mais novo se calasse de uma vez por todas. Sempre temos uma oportunidade de aliviarmos nossas frustrações, fracassos e ódios em algo que não reage, ou não quer reagir, que nos ama, ou que apenas está acuado, não tem culpa ou mesmo não tem sorte de estar ali. Ele foi bastante eficiente em não perder a chance.Não vi nem ouvi mais nada. Estava encolhido, no cantinho onde meu gabiru resolveu deixar este mundo, e que agora me fazia uma maldita inveja. Aquele corpo cambaleante saiu correndo pelo beco da casa, madeira na mão direita, a sua mais forte, soltou-a e correu ainda mais. Meus irmãos vieram em seguida; primeiro olharam meu corpo paralisado, depois foram para a sala, e viram outro corpo, mutilado, cabeça estourada, sem ruído nenhum. Eu no começo achei bom o silêncio, mas quando você se acostuma com algo, presencial, sonoro, sentimental, o que quer que seja, é difícil se desvencilhar. Levantei e fui para a sala. A pior coincidência acontece justamente nestes momentos; minha mãe tinha conseguido uma lata de leite, intacta. O homem que comprou para ela se compadeceu de sua situação, num mercadinho a alguns quilômetros de nossa casa,e quando ela agradeçeu ao moço do quadro pela provisão, falando com vergonha, o homem disse que ela não deveria perder tempo com isso; se quisesse, poderia agradecer somente a ele, porque foi o único que ouviu o seu clamor e a ajudou. Ela ficou meio sem graça, mas assentiu . A lata caiu no chão quando ela viu o que eu não pude olhar acontecer. Não quis saber de mais nada, a não ser tirar o moço do quadro da parede e com ele discutir, gritar, perguntando o por quê, qual o motivo. Eu lembro bem que ela pediu aquilo, várias vezes. O moço do quadro não é tão surdo, nem tão displicente assim, afinal. Veio a Lei, e a casa foi fechada. O caçula ficou famoso. Meu pai morreu na cadeia. Minha mãe matou-se, enforcada. Meus irmãos se danaram, e eu continuo vivo, numa destas tramas do Destino, falando para crianças infelizes.

Nota do autor:
Agradeço aos noticiários policiais diários pela inspiração.


21 de junho de 2010

Um Escritor e o Desescrever - Parte I

Aquela cidade estava encravada numa pequena ilha, não muito distante do continente. Minha velha genitora tinha um sonho: conhecer uma pequena posição geográfica como esta. As ilhas sempre trazem um distanciamento, uma revolta em favor da solidão, e não parece ser muito distante os conceitos de Darwin sobre a proliferação de espécies exóticas, diferentes das demais, adaptadas aos ambientes mais separados das grandes convenções biológicas. Era possível perceber isto ali; tanto a natureza quanto os homens eram de uma singularidade ímpar, não detectável em lugar algum.
Tinha ido nesta viagem à convite de um professor emérito da universidade de... da qual fiz parte do corpo docente.Eu estava aposentado, e ele havia visto minha fotografia num jornal da ilhota, de pequena circulação. A internet também estava repleta de citações dirigidas a mim, dito um grande escritor, aclamado e sem dúvida bastante conhecido em toda a parte. Ele havia me lançado um desafio, pois já vivia ali há alguns anos, e fez um certo segredo, dizendo que seria bem mais conviniente se me dirigisse até lá, para tomarmos um bom café (este continental) e discutirmos o teor desta tal empreitada. Assim sendo, segui, intrépido.
- Que bom que veio, George. Está bem mais magro... e continua um fumante inveterado.
- É gregor, algumas coisas nunca mudam, não?
- Sim, nunca mudam. Como foi a viagem até o cais? E a baldeação, ainda conturbada?
- Pareceu-me bastante agradável. Não vi nenhuma balbúrdia.
- Esta ilha era uma novidade quando vim para cá. Naquele tempo a travessia era bastante tempestuosa, mas parece que nisto também houve modificações. Vamos, meu carro não está longe daqui.
Era inevitável não perceber a organização daquele lugar. As estradas, todas excelentes, eram bem sinalizadas; as ruas, todas, em impecável harmonia, e as casas não diferiam muito em conforto e boa aparência. Não vi transeuntes. É verdade que chovia um pouco, e o frio era intermitente, mas nem estávamos num dia de feriado ou final de semana, momentos comuns lá, nas grandes cidades, onde isso acontecia, frequentemente. Gregor explicou esta minha observação dizendo que ali era normal as pessoas não saírem com frequência, preferiam ficar em casa assando petiscos em suas lareiras e se distraindo com as programações da TV local.
- Aqui há uma emissora de TV?
- Sim, há. Fiquei surpreso também. Não consegue-se captar qualquer sinal na capital, e de lá nada vem. Estranho, não?
- Parece. E o jornal, poderia me mostrar algum exemplar?
- Tenho a edição de hoje em casa, logo logo vai poder vê-lo. Aliás, isto tem a ver com o propósito de sua vinda aqui. Algumas surpresas o aguardam, George.
Paramos em um pequeno mercado, bem ao lado da rodovia, que estava bastante segura das fortes ondas que vinham do oceano por um sistema de diques fabuloso. Gregor pretendia comprar alguns itens que faltavam para o jantar, que se aproximava, e algumas bebidas para o encontro. Preferi ficar no carro, observando aquilo que agora era uma pequena tempestade invernal. Sempre fui bastante ávido com aquilo que não conhecia, e resolvi rapidamente adequar os sentidos para tudo o que me era mostrado naquela paisagem. Tudo estava normal, mas de repente um fato me deixou confuso, realmente perturbado por alguns segundos. Gregor estava com algumas sacolas nas mãos, e pediu minha ajuda para colocar tudo aquilo na mala, não tinha trazido qualquer agasalho ou guarda-chuva para aquela ocasião.
- A tempestade intensificou-se. Mas tudo aqui é bastante tranquilo, não se preocupe. Minha casa é bem aconchegante nestes tempos de frio, vai gostar.
- Gregor, não pude deter minha curiosidade num aspecto que pecebi naquele mercado...
- É melhor nos apressarmos, se quisermos aproveitar a noite que se segue, não?
- Sim, vamos, mas...
- Calma, meu caro. Já sei o que incomoda você. Isso faz parte do plano. Se conseguir conter as impressões em seu cérebro, assim que nos acomodarmos tudo será dito, ok?
- Tudo bem.
Seguimos em direção à casa de Gregor. segui-se na estrada, pelo lado direito, uma pequena floresta de pinheiros agradável e buliçosa, por conta dos ventos que vinham do mar. Tudo muito bem delineado, cada espaço entre as árvores era, ao que me veio á mente, milimetricamente definido, padronizado. De soslaio percebi que Gregor estava atento ao que eu estava percebendo, e um ensaio de sorriso surgiu. Aquilo tudo estava começando a me deixar nervoso.
- Se quiser cigarros, aí tem um bom maço. Havia deixado o jantar em "stand by " antes de seguir para o cais. Não demora muito e logo estaremos em local seguro. - disse Gregor, de olho na estrada.
- Preciso realmente tomar um bom banho.
Depois de um pequeno monte, bem arborizado, uma pequena estrada entre a floresta nos levou até a casa de Gregor. Era em estilo vitoriano, branca, rodeada pelos pinheiros molhados, com uma boa frente descampada, repleta de folhas amareladas do recém terminado outono, que ali era bastante evidente pelo visto. Quatro colunas seguravam aquilo que era um terraço bastante agradável, gradeado á altura de uns 1,10cm; uma cadeira de balanço e algumas cadeiras em cana-da-índia. Gregor estacionou a sua BMW SW bem em frente ao terraço, correu para a mala e retirou ás pressas os itens que havia comprado, e fomos para dentro.
- Seja bem-vindo, George. Aqui pode se sentir em segurança.
- Por que eu deveria e sentir seguro? Você já vem insinuando isto desde que saímos do mercado, quando eu ia inquiri-lo sobre o que vi...
- O que prefere, spaguetti a bolongnesa ou ravioli em molho branco?
- Bom, o que preferir, mas...
- Se não em engano, ouvi você falar em banho no carro. Bem, posso ajudá-lo com isso oferecendo uma boa suíte, no final do corredor, subindo as escadas. Tudo está lá, pronto para lhe ser útil. Se precisar de algua coisa a mais, grite.
Subi as escadas, acompanhado por belos quadros bem dispostos na parede.
- São artistas locais, acredita?
- Fantástico, Gregor!
- Por isso estão aí, hehehehe... vamos, apresse-se, vou também cuidar do meu asseio. Até breve!
Havia mais quadros, obras belíssimas, por toda a casa. O pavimento superior estava repleto de pinturas de extremo bom gosto, que em nada deviam aos italianos, flamengos ou ingleses que já tinha visto antes.Esculturas magistrais também povoavam as estantes, em médias colunas coríntias realmente impressionantes. Na suíte realmente não faltava nada. Tudo bem organizado e em ótimo estado, convidativo para um banho demorado e quente.
Quarenta minutos foram necessários para que o cheiro da maresia fosse pelo ralo, e eu realmente me sentisse civilizado e limpo outra vez. Gregor já estava na cozinha, vinho aberto e duas taças, uma quase no fim.
- Com está se sentindo, George? Espero que tudo tenha estado a seu gosto.
- Sua receptividade é incrível. Realmente não me enganei em vir.
- Que bom que tenha gostado. Sente-se, tome um pouco de vinho. A temperatura ambiente está agradável para você?
- Sim, nada muito diferente do frio do continente.
- É. Eu sempre tento manter a temperatura a mais parecida com o continente. Faz algum tempo que não o visito. As tarefas cotidianas têm castrado meu tempo.
- E como andam as coisas por aqui? Soube que você instalou-se numa universidade recém criada...
- Sim. Eles precisavam de um professor de semiótica, e tive a oportunidade de ser contratado. Você sabe, George, estamos aposentados, mas não podemos nos esquivar de desafios. Trinta e cinco anos de sala de aula não foram o suficiente, e aqui, especificamente aqui, tudo isso é potencializado, pode acreditar.
- Por que?
- Decidi pelo spaguetti. O que acha?
- Perfeito! este vinho cairá bem com a massa.
- Ótimo. Estamos indo bem.
- Receio que há em você uma esquiva em relação aos meus questionamentos sobre este lugar, e sobre o que vi. Acredito que o mistério traga uma sensação saborosa a você, mas a mim é massacrante.
- Está ficando velho e enferrujado, George. Você sempre foi o mais arguto entre nós.
- Esta reflexão sobre mim eu não conhecia, hehehe.
- Nenhum outro poderia estar aqui, George. Esta ilha guarda algo que você certamente desconhece. Acredite, não está aqui por acaso.

continua...