11 de agosto de 2009

Como Cães e Gatos - Revoluções possíveis

Quase lobotômico, a andar sem pressa como manda a praxe a quem não tem muito o que fazer, deparei-me com uma cena extremamente comum, mas agora com um ar fantástico, devido a uma revelação (de forma alguma divina ou o que quer que o valha) e que nunca tinha percebido antes. Sentei-me em um bom banco de praça, e logo pus a funcionar a máquina dos raciocínios. O que era a visão dantesca? Um encontro entre um cão enorme e um gato, de rua.
O grandalhão parecia bem nutrido, garboso, certamente de uma raça estrangeira que não consegui indentificar e aspecto mesmo aterrador. o gato - magrelo, pequenino, maltratado e sem dúvida faminto, pois estava justamente saboreando um belo exemplar de cabeça de peixe e um pouco de sopa deixados por um algum mendigo que estivera ali há pouco. A dicotomia era evidente, mas as atitudes entre os dois animais, um perante o outro, eram intrigantes. Cães e gatos são atraídos quase sempre pela luta, pelo confronto inevitável entre elese quase nunca evitado. Os caninos, hipoteticamente, teriam uma vantagem estrutural, de vigor e força infinitamente superiores à primeira vista; os felinos, ao contrário, não dispunham destes artifícios que muita gente acha indispensáveis em um duelo. Mas o que me fascinou e despertou toda esta abordagem foi o gato: ele teima em resistir. Em profunda desvantagem, este desprezível oponente daquele gigante rosnador cria um mecanismo de defesa inteligente para travar o cachorro, fazendo com que os seus pêlos se arrepiem e dêem uma impressão geral que o bichano é maior, mais robusto do que parece. Este propósito, pensei eu, era justamente para avisar ao cachorro, já que os gestos neste caso valem muito, de que ele não iria se deixar vencer, que ali estava um gato, magro, o couro e o osso, mas um gato. Se alguém tinha que se dar por vencido ali certamente não era ele. O cão, por sua vez, parece que tinha perdido aquela imponência, o garbo do início. Olhando para os lados e dando pequenos passos para trás, aquele bicho, outrora altivo, estava realmente recuando, perdendo terreno, sendo subjulgado e humilhado por aquele bichano ,improvável vencedor sob todas as óticas lógicas e possíveis; parecia mesmo que ele acreditava que o gato tinha dobrado de tamanho, e muito menor do que ele ainda, mas bem maior em determinação, em coragem e inúmeras vezes mais destemido. Esta revolução, em todos os aspectos, do gato, transforma aquele duelo em algo que todos nós já vimos e muitas vezes até rimos quando vemos: o cão dá o fora, covardemente, enquanto o gato, inflexível e ainda atento, volta aos poucos a sua forma original. Ver aquilo tudo fez-me pensar...

"Bem que esse gato poderia ser o povo..."