4 de agosto de 2009

Considerações sobre o Medo

Nietzsche achava que o medo era o grande responsável por todas a moralidade humana, sua teimosia em não seguir o que a vida lhe ditava e a sua mediocridade em renegar esta mesma vida. Com o medo, o ser humano anula-se, perde sua essência primeira, pura, das vontades enquanto manifestações naturais, experimentando sensações somente perceptíveis diante do ato destemido. Quando crianças, fantasmas e bichos-papões eram os nossos maiores medos. Suas figuras nos traziam à lembrança aquilo que nos era ditado pelos mais velhos como seres abomináveis, terríveis... quando na verdade eram figuras míticas destinadas a prender nossa atenção para que não fizéssemos algo que desagradasse à nossos pais. Este sentimento, que visceralmente nos atinge, tanto psiquicamente quanto fisicamente, mostrando que está ali e que não vai nos deixar em paz, nos é útil em meios naturais, evolutivos. O medo provoca receio, ponderação, sentimentos muito interessantes quando se está na luta pela sobrevivência; mas inibe o que há de melhor em nossas ações, nos castrando, nos violando. Há algumas situações em que ponderação e receio são inúteis. O desafio a ser vencido, as sensações alquímicas da liberdade irrestrita, o amor verdadeiro, o romper dos dogmas, que sabemos serem ridículos, estes valores dependem de respostas rápidas, e o medo e sua trupe têm o péssimo gosto de serem lentos e meticulosos. O que quero dizer é: se o medo nos pondera, por que ainda somos solidários a ele em nossas relações? Surgimos em um meio medroso, onde quase tudo é erro e censura. Os ícones, os mitos, todos eles possuíam medo, porém não se intimidaram. Sabiam que aquilo era tudo o que a maioria queria, estes mesmos que hoje ainda persistem. Talvez uma reação de raiva, de inconformismo, de transgressão tenha eclodido justamente dos ovos postos pela reflexão demasiada, da cautela que não deturpa, que não denigre.Somos desafiados, instigados a transpassar os valores, os pré-requisitos, as fórmulas prontas, e mergulharmos no desconhecido que não podemos ver quando estamos perplexos. O medo é institucionalizado, tido como ferramenta fundamental de gerenciamento dos governos, dos Estados modernos; a fé impõe medo, indicando um caminho ideal, uma marcha de cordeiros obedientes e santos, justamente por renegarem sua humanidade, falsearem suas vidas e silenciarem diante dos gritos da vida, sempre pulsante. Os mansos herdarão a terra... cheia de odor covarde, vazia de som, de cor, de possibilidades.